17/08/2016

Campo - Poema de Cecília Meireles




Vem ver o dia crescer entre o chão e o céu,
o aroma dos verdes campos ir sendo orvalho na alta lua.

Os bois deitados olham a frente e o longe, atentamente,
aprendendo alma futura nas harmonias distribuídas

O mesmo sol das terras antigas lavra nas pedras estrelas claras.
Nem as nuvens se movem.Nem os rios se queixam.

Estão deitados, mirando-se,dos seus opostos lugares,
e amando-se em silêncio, como esposos separados.

Neste descanso imenso, quem te dirá que viveste em tumulto,
e houve um suspiro em teu lábio, ou vaga lágrima em teus dedos?

Morreram as ruas desertas e os ávidos habitantes
ficaram soterrados pelas paixões que os consumiam.

A brisa que passa vem pura, isenta, sem lembranças.
Tece carícia e música nos finos fios do arrozal.

Em tua mão quieta, pousarão borboletas silenciosas.
Em teu cabelo flutuarão coroas trêmulas de sombra e sol.

Tão longe, tão mortos,jazem os desesperos humanos!
E os corações perversos não merecem o convívio serenos das plantas.

Mas teus pés andarão por aqui entre flores azuis,
e o perfume te envolverá como um largo céu.

O crepúsculo que cobre a memória, o rosto, as árvores,
inclinará teu corpo, docemente, em sua alfombra.

Acima do lodo dos pântanos, verás desabrochar o vôo branco das garças.
E, acima do teu sono, o vôo sem tempo das estrelas.


Cecília Meireles




2 comentários:

  1. Os campos ficam mais floridos com os poemas de Cecília Meireles.
    Adorei a imagem e o poema Maria Rodrigues.
    Bjs-Carmen Lúcia.

    ResponderEliminar
  2. Sou fã da poética da maior Poeta brasileira
    e este poema dela eu adoro!!!
    Grata pela preciosa partilha, querida Maria!
    Beijinho.

    ResponderEliminar

“Aqueles que passam por nós, não vão sós, não nos deixam sós. Deixam um pouco de si, levam um pouco de nós” (Antoine de Saint-Exupery).

Obrigado pela sua visita e pelo carinho que demonstrou, ao dispensar um pouco do seu tempo, deixando aqui no meu humilde cantinho, um pouco de si através da sua mensagem.

Topo